segunda-feira, 13 de junho de 2011

"Peguei um baláio, fui na feira roubar tomate e cebola
Ia passando uma véia, pegou a minha cenoura
"Aí minha véia, deixa a cenoura aqui
Com a barriga vazia não consigo dormir"
E com o bucho mais cheio começei a pensar
Que eu me organizando posso desorganizar
Que eu desorganizando posso me organizar
Que eu me organizando posso desorganizar"

C. Science

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Escafandro e Camafeu.

São as palavras mais íntimas e mais distantes de mim. Sempre as tive aqui em mim, mas durante anos não sabia os seus significados. Amava, porque o seus sons eram bonitos e eu imaginava que quando descobrisse o significado, iria achar bonito. Vivi o mistério durante muito tempo... o não-saber é belo.
Pois bem, faz um bom tempo que fui assistir à um filme "O escafandro e a borboleta"; fui sem saber o que era escafandro e quando meu amigo quis me explicar, eu pedi pra parar. Assisti o filme sem saber. Depois de alguns dias, acabei com o mistério, peguei o dicionário. Pronto, me apresentei ao escafandro e ele também me conheceu, viramos amigos. Ele, de fato, é bonito. Ajuda o homem a respirar, entrega um novo pulmão, faz a gente poder ser peixe.
Quanto ao camafeu, até essa semana, relutava fortemente em saber seu significado e continuava o achando uma das coisas mais lindas do mundo. Aí, Vovó Minha, me mostrou um brinco seu, bem antigo e disse: "É bonito, não é habib? É um camafeu". Pronto, todo mistério se desfez e da forma mais bonita. Até hoje ela não sabe o que fez com o camefeu e comigo. Existem momentos que são tão suaves e tão belos, que eu não ouso prende-los em palavras. Esse foi um desses. Ele está lá, eterno.

Agora eu ando por aí, com o escafandro e o camafeu. Sem mistério, mas com beleza. Eu sabia que eles eram lindos.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Aprendendo a respirar

Eram dois homens, na beira da praia. Acabaram de se conhecer, o que tinham em comum, além da idade, era o mar. Então, conversaram sobre ele:

- Sempre que eu tento me catar, eu me espalho.

- É? E eu me dissolvo... quem vai ter mais trabalho?

- Eu não sei.

- Pois é... como água, eu es-corro de mim.

- Como éter, me fundo com o ar.

- E depois vc se respira?

- Geralmente me falta o ar.

- Ah...

Os dois, por não se entederem, resolveram andar. Ás vezes, os pés em movimento, clareiam a cabeça. E o moço que não consegue se respirar, continuou:

- É porque eu nunca quero as pedras da beira da praia. Sempre quero as do fundo, as que dão trabalho pra pegar. Só que, eu me pergunto: e se eu for? e se faltar o ar? se meus pulmões não suportarem?

- Vamos?

- É que eu não sei nadar...

- Ah... então acho melhor vc ficar com as pedrinhas da beira da...

- Vc tem um escafandro?

Na tigela

Já que o dia está sendo assim, permeado pela energia vital freudiana, vou até o fim.
Hoje, re-escutei essa música: "Seu suor é o melhor de vc".

E só hoje me toquei da tamanha pretensão desse homem. Ele faz o tipo "tão cheio de si", "cheio de toda a certeza do universo" de sua virilidade, que me irrita. Mas essa irritação não demora muito e logo depois vem o oposto dela: a certeza de que ele é muito. E sim: ele tem o melhor de mim e eu guardo pra ele. Ele quer se soltar e não consegue, é meu salvador e quer meu resto, é meu prazer, está em meu suor e o melhor de mim... está nele.
Nem ele tem a certeza do que é, do que quer e nem eu. Mas, eu e ele temos uma única certeza: o desejo cortante. Com palavras atrapalhadas, narciso e doação, retenção e gozo. Tudo junto e fundido. E o que torna esse homem forte e desejável, é justamente esse caos, essa dúvida exposta com tapa na cara. O caos atrai, isso é fato.
Na vida, se busca ordem. Nas pessoas, caos. Porque assim, a gente vai se resolvendo enquanto resolve o outro.

E esse homem, me entrega o caos em uma grande tigela e me manda comer com minhas mãos, sem despertiçar e guardar um pouco pra ele. Porque ele se atrai por seu caos, ele quer se provar... mas antes: eu.

Eu provo. Guardo em mim. Guardo tudo em mim. E lhe digo, em baixo tom, encostando aos poucos: "O seu melhor está em mim".

Páginas táteis.

Certa vez, Antoine Saint-Exupéry disse que a "a sensualidade é ridícula" e eu concordo porque eu sei (humm) o que ele quis dizer com isso. Quando o homem vive essa sensualidade de forma forçada, eu sinto asco. Quando uma mulher faz isso, quase sempre beira o cômico.
Essa coisa programada, posada, estilizada, travestida de sei-lá-o-quê, nunca, nunquinha me foram confortáveis. Durante alguns anos, na adolescência, me senti masculina e como estratégia compensatória, me afeminei muito; muita maquiagem, saltos e mais saltos, calças justas e mais justas. É fase. Passou.
Redescobrir minha feminilidade e minha sensualidade (ui!) não foi do dia pra noite... e também não foi o processo mais suave da minha vida, porque minha parte infantil sempre ocupou muito espaço em minhas "instâncias psíquicas".

Isso tudo pra dizer o seguinte: quem me ajudou nesse retorno à feminilidade perdida, foi Anais Nin.
Em minha viagem pra Buenos, conheci uma menina-maravilhosa, que levou em sua mala um livro dessa mulher, que pegou emprestado de um amigo.
Sem detalhes da história, foi por conta desse livro e dos grifos do dono do livro, que eu alumiei uma parte minha, com uma luz tão forte, que eu vi foi coisa...

Me encontrei com Anais e com seu universo, cheio de corpo e flúidos e suor. E muitas palavras. Grande experiência. Soul grata.

Minha casa azul.

Agora à noite sonhei que estava em uma casa. Uma casa velha, caindo aos pedaços, azul. Ela era azul, em tons desbotados "e aquela num tom de azul, azul inexistente, azul que não há, azul que é pura memória de algum lugar". Era um azul tão lindo, e seus tons iam do azul marinho ao quase branco. A tinta, em algumas partes estava descascando. Ela não era minha, e uma pessoa me apresentava à ela, mostrava os cômodos, e alertava "ela está muito velha, pode cair em qualquer momento". A casa era redonda, parecia uma oca, mas era de concreto, tinha sala, quarto. Eu tocava algumas partes e ela estava fofa, era muito frágil. Ela era tão antiga, mas tão infantil...A casa era frágil, eu tinha que andar bem devagar pra ela não cair. Mas eu a amava tanto! Eu estava revisitando a casa, com um saudosismo, mas a pessoa estava me apresentando à ela, como se não soubesse que eu a conhecia. Minha sensação era: "ela não vai cair", mesmo vendo com meus olhos, que ela estava caindo. Era tão velhinha, estava pingando, com mofo, mas eu gostava dela e estava feliz por estar ali dentro. A sua fragilidade me fazia desejar cuidar. Era desejo de tatear com mãos leves, aos pouquinhos, devagar, com voz baixa e olhar sereno. Só assim, ela não cairia. Cuidar da casa. Eu a amava por ser frágil, por demandar de mim passos brandos e uma delicadeza que trisca as coisas. A minha casa me ensina a ser suave. E me ensina a ter força para reconstruir, carregar tijolos, galões de tinta, se preparar para a chuva. Me ensina a ser fortemente delicada.



De que casa estava falando?
O que o consciente omite, o inconsciente grita.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Rendo-me.

Passei dias sem escrever aqui. Fui me guardando em pequenos papéis, que foram se perdendo e com eles foram pedacinhos meus. Sinto que meu ar estava em suspensão. Agora voltei a respirar.

Acho que estava me testando. Será vício, será pura necessidade de reflexão, catarse diária? Sedução do olhar do outro? Preciso mesmo escrever?


O tempo passou e cá estou eu, de novo. Como mulher que se separa do marido e deixa uma fresta da porta aberta. Hoje, arrombei a porta.

Hoje, não tive papel e caneta e me vi amputada, porque tudo escorreu pelos olhos e minhas mãos não sabiam o que fazer. Foi difícil ficar só com lágrimas, as mãos pareciam perdidas, tateavam em um escuro.

Minhas lágrimas foram de félicidade. Fé no Humano. Alegria que se transforma em água e sal e me molha.
Mas, elas não foram completas. Eu desejei tranformá-las em palavras, porque assim, poderia revisitá-las em algum momento futuro. Palavra é posto.

Por isso, voltei.

As palavras me deixam mais bonita. São elas que pintam meus dias, que tranformam cinza em verde. Enfeitam meus cabelos, pintam meus lábios, perfumam meu cheiro.

Me rendo à vc, Palavra. Lhe entrego minhas mãos. Faça delas o que sentir vontade. São suas.